terça-feira, 24 de novembro de 2009

Bom dia, dia, bom dia!


por Jorge Azevedo

Que tenha beleza
As coisas tristes
E nas sombras surgidas
Surjam luzes de sonhos.
Que cada canto,
Mesmo os de pesares
Sejam repletos de encantos
E de alegrias.
Em cada beijo maldito
Encontre a boca,
O ópio do amor perdão.
Bom dia dia, bom dia!
Bom dia sol, bom dia!
Bom dia meu amor, bom dia!
Que a bala assassina
E covarde decepando a vida
Traga esperança de paz
Através das lágrimas tantas
Lavando rostos
Ainda não lavados
No despertar.
Que as sirenes estridentes
Nas ruas e vielas,
Mesmo sendo de carros brancos
Ou de tons mordazes,
Sejam também gritos
De liberdade nos guetos
E nas fábricas indiquem
A rotina da busca
Do pão de cada dia.
Que o tilintar de ferros
Não seja somente de correntes
Atadas nos pulsos e tornozelos,
E nem chicotadas de espadas
Nos lombos de negros
Indefesos...
Seja também,
Música nas fábricas
Repletas de pais e mães
Arquitetando a casa própria
E o deleite da universidade.
Bom dia, dia, bom dia!
Bom dia para os descasados,
Separados de suas casas,
Para os doentes desprovidos
De sua saúde,
Para os céticos despidos
De toda fé,
Para os brutos despejados
De humanidade.
Bom dia planta, bom dia!
Pássaros e aviões barulhentos,
Carros fumegantes nas estradas
E trens repletos de carvões.
Bom dia lagos, e lagoas,
E rios poluídos pelo progresso,
Mares enfeitados de latas vazias
E garrafas plásticas coloridas,
Peixes mortos e inchados,
Cheiro putrefato de vida podre
Nos óleos de navios cinza.
Bom dia vida, bom dia!
Nas carcaças africanas
Além dos mares de Cabral,
Além das curvas de Colombo
Onde a morte faz festa
Na morte de reis devassos.
Onde canta o uirapuru
Diante da árvore caída,
Do ninho encharcado
De gemas e vidas sem formas
Ainda, de tão recente postura.
Onde gralha a gralha branca
Sem caça e sendo caçada
Por homens e espingardas
Carregadas de risos satânicos.
Muge a vaca no outeiro
E no terreiro sem chibata
O escravo ordenha cabras
Amarrada com sisal ainda vermelho
Manchado pelo sangue
Do dedo esmagado na máquina
Desfibradora e artesanal.
Canta na televisão o padre
Uma canção falando de um Deus
Imenso e cheio de bondade
Enquanto canta a campainha
Em portas pintadas
Falando de restos de pães
E roupas imprestáveis.
Bom dia dia, dia bom dia!
Bom dia para todas as amarguras
E todas as dores,
E que sejam transformadas
As agruras neste dia
Em momentos de somente
Felicidade.
("Folhas de Setembro - Poemas solitários" - Jorge de Azevedo)

Quando os sonhos deixam de existir, a vida começa a morrer


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